Eric Satie e o Neoclassicismo
No início do século XX, de 1914 a 1918, ocorreu a Primeira Guerra Mundial. Antes disso, o
Romantismo já atingira o seu apogeu e muitos compositores se encaminhavam para uma estética de abertura e renovação, percebida desde o final do século XIX. Depois da guerra houve mudanças substanciais não só no pensamento e nas atitudes, na maior parte do mundo ocidental, como no contexto das artes em geral e da música. As gerações que viveram a guerra passaram a pensar a música de maneira diferente.
Importantes compositores decidiram buscar novos caminhos e um destes
caminhos tinha por base a música mais antiga, anterior ao romantismo. Nasceu
uma escola que foi chamada de Neoclassicismo,
caracterizada por atitudes anti-românticas: a objetividade em vez da
subjetividade do romantismo. Tais compositores sentiram-se atraídos por um
retorno ao séc. XVIII, tratado porém com
ironia. Concluíram que podiam aproveitar muito do “velho estilo”: a vivacidade
rítmica, nitidez de ideias, as formas
concisas do barroco e do classicismo (ao contrário dos modelos longos e complexos,
a exemplo de Mahler).
O neoclassicismo significava
acima de tudo, ironia; e o objeto dessa ironia com o passado, podia ser buscado
em qualquer época.
Um dos principais, senão o principal dos compositores dessa nova
tendência, foi Igor Feodorovitch Strawinsky ( S. Petersburgo, 1882- Nova York, 1971). Strawinsky entregou-se ao neoclassicismo motivado por Diaghilev.
Serge Diaghilev ( Rússia, 1872-
Veneza, 1929) foi um legendário e brilhante empresário de balé, fundador da
companhia de Balés Russos, que eletrizou Paris na década de vinte. Teve o extraordinário mérito de atrair e
envolver em sua companhia e seus espetáculos os maiores compositores da época
como Debussy, Strawinsky, Prokofieff, Ravel, Satie; os maiores pintores como Picasso, Braque,
Utrillo; os maiores escritores com destaque para Jean Cocteau. Produziu e criou
coreografias antológicas para os balés Petruchka, Sagração da Primavera, Les
Noces, Parade, Jeux, Prélude à l´ Aprés Midi d´un Faune. Ainda revelou os mais célebres bailarinos da
história, principalmente Nijinski, e outros como Serge Lifar e Ana Pavlova, tão
importantes quanto.
Eric Satie
(França, 1866-1925)
Compositores do período tiveram atitude sistemática e irreverente em relação ao
passado, principalmente aqueles atuantes em Paris, cidade adotada por Strawinsky.
Em 1920, influenciados pelo literato Jean Cocteau, alguns desses músicos
reunidos no que se chamou o Grupo do Seis (que incluía Tailleferre, Poulenc,
Darius Milhaud, Honegger, George Auric, Louis Durey) adotaram a estética da irreverência
e anti-romantismo: música direta, secamente espirituosa e atual.
Escolheram por modelo Eric Satie, que enveredara por uma espécie de dadaísmo[1]
Ele queria a música reduzida ao estritamente essencial. Era dono de um terrível
senso de humor e de paródia. Colocava títulos surrealistas em suas peças como: Choses vues à Droite et à Gauche sans
lunettes, Trois morceaux en forme de
poire, Sonatine Bureaucratique, Embryions dessechées ( Coisas Vistas à
Direita e à Esquerda sem Óculos, Três peças em forma de Pera, Sonatina
Burocrática, Embriões Dissecados) e cultivava sua inconsequência na “música de
mobiliário”, isto é, música de fundo,
destinada a ser ignorada. Suas indicações de dinâmica eram no mesmo estilo: pp en pauvre souffle , avec beaucoup de mal ( pp já sem fôlego com muita
dificuldade). Na música, a escrita era esparsa, seca, caprichosa, paródica,
espirituosa como no balé Parade (1917)
que descreve uma parada, um desfile de circo,
numa sucessão de construções
musicais ingênuas e de cuja orquestração
fazem parte os sons de um revolver e de uma máquina de escrever. Entre outros
exemplos despojados e minimalistas, estão as Gnossiennes e as Gymnopedies, peças para piano.
Para o balé Parade, Picasso desenhou a cortina de cena do
palco do teatro que ficou famosa e hoje corre mundo em exposições a exemplo da
que foi realizada em S. Paulo, em 2004. Picasso
desenhou também a capa da partitura de Rag-time, de Strawinky, o
cenário e figurinos para o balé Pulcinella e a caricatura do autor; Jean Cocteau fez a caricatura de Satie.
Os primeiros anos do século XX
representaram um período de rupturas, de amplas mudanças, de liberdade de
criação e de multiplicidade de tendências que marcaram a história da música
ocidental. ( Alex Ross, O Resto é Ruído; Paul Grffiths, A Música Moderna).( Caricatura de Satie por
Jean Cocteau - Griffiths)
[1]
Dadaísmo- movimento literário lançado em 1916 por Tristan Tzara, escritor
francês de origem rumena (1896-1963) e cujo princípio essencial era, tal como
no superrealismo que lhe sucedeu o apelo ao subconsciente: dada.
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